quarta-feira, 31 de outubro de 2012

E agora, José Serra?


Sócrates Santana*

Não existe mais uma pedra no meio do caminho do senador Aécio Neves. Ao menos, no PSDB.  Afinal de contas, a derrota de José Serra não significou apenas a vitória do PT em São Paulo. Representou o término de um ciclo paulista no ninho tucano, onde a mensagem de despedida dos serristas à presidência passou de um até logo para um adeus melancólico das urnas do seu principal reduto eleitoral. “A festa acabou”, diria o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, que comemoraria hoje - se vivo fosse - 110 anos.

Em Minas Gerais, o PSDB venceu em 143 municípios, enquanto o PT elegeu 114 e o PMDB 119 prefeituras. Mas, restou ao PSB do governador pernambucano Eduardo Campos a cereja do bolo: Belo Horizonte. Com o apoio de Aécio Neves, o prefeito reeleito Márcio Lacerda (PSB) derrotou o ex-ministro Patrus Ananias (PT), apoiado pela presidenta Dilma Rousseff. Mas, a única cidade acima de 200 mil eleitores governada pelo PT a partir de 2013 em território mineiro será Uberlândia.

A disputa na capital mineira serviu como uma prévia da eleição presidencial de 2014. De um lado, a aliança entre o PSDB e o PSB. Do outro, a manutenção de um casamento temerário entre PT e PMDB. Fora da disputa, após perder a eleição municipal para Fernando Haddad (PT), o ex-presidenciável José Serra, com a chave na mão, “quer abrir a porta”, mas, “não existe porta”, porque, Aécio Neves levou para Minas Gerais.

O deslocamento político do ninho tucano para Minas Gerais é acelerado na mesma medida que ocorre também um reposicionamento da hegemonia petista do nordeste de volta para o eixo sul do país. Dos eleitores a serem governados por prefeitos petistas a partir de janeiro, a maioria absoluta (51%) estará no Estado de São Paulo. Além da capital, o partido ganhou em municípios de peso na Região Metropolitana, como Guarulhos, Osasco e São Bernardo do Campo.

A ascensão do PSB nas cidades mais pobres do país simboliza também a redescoberta de uma quarta força partidária no Brasil, antes ocupada pelo metafisico DEM/PFL, reanimado com a vitória em Salvador e Aracaju. Porém, coube ao PSB fincar a bandeira no Nordeste, com a conquista dos maiores contingentes de população em Pernambuco e no Ceará, no Sudeste (Espírito Santo) e no Norte (Rondônia).

Apesar do esforço do governador Geraldo Alckmin (PSDB), pouco restou de consolo ao desgastado José Serra. O próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso admite a necessidade de renovação do PSDB, mesmo ante os chiliques do correligionário derrotado. Tem que marchar, José! Nova ou velha, a escolha tucana é esquizofrênica e não entrou no bonde da renovação proposta pelo PT de São Paulo, o PSB de Pernambuco, o PMDB do Rio de Janeiro e, até mesmo, o conservador Democratas na Bahia. Mas, renovação é coisa do PT. “José, pra onde?”, responde o mineiro Carlos Drummond de Andrade a pergunta de José Serra. Pra onde?

*Sócrates Santana é jornalista.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Um engano de Samuel Celestino

O comentarista Samuel Celestino cometeu mais um engano. Pormenorizou o comício realizado por Nelson Pelegrino em Cajazeiras, minimizou o impacto do discurso da chefe do executivo nacional, Dilma Rousseff, bem como, reduziu o papel histórico do bairro mais populoso de Salvador.

Ao contrário do comentário do renomado jornalista baiano, um comício não é um local apenas para arrancar risos da platéia. Em qualquer parte do mundo, mas, especialmente, na Bahia, a realização de um comício define quem tem força, apoio político e popular.

Ao longo dessas eleições, nenhum comício liderado pela candidatura de ACM Neto aconteceu. O mais perto de uma reunião pública de massa ocorreu em Plataforma. O próprio jornal de propriedade da família Magalhães ironizou a realização de um "comício" improvisado no Subúrbio pelo candidato do DEM. A partir da constatação de que ACM Neto não promoveu um único comício, o óbvio de qualquer comentário sobre o assunto "comício", seria avaliar e julgar os motivos da campanha do Democratas ignorar um dos eventos mais utilizados para arregimentar e conquistar multidões.

Desde que política é política, a realização de comícios simboliza força, apoio popular e político, dentro e fora do palanque. É - portanto - opaco e estranho o comentário de Samuel Celestino. Talvez, nenhum outro jornalista ou repórter em atividade no estado, possua mais experiência e sensibilidade para observar a lacuna ou ruptura no modo de construir uma candidatura à prefeito da capital baiana realizada por ACM Neto.

Antes de um observador mais apressado definir como uma simples opção de método ignorar a realização de comícios ao longo da campanha é preciso demarcar uma questão: não é comum. E não é comum porque os comícios sempre foram utilizados como balizadores, termômetros de um quadro eleitoral prático, visível e palpável. E não realizar um comício demonstra para o leitor mais afoito fraqueza.

No caso de ACM Neto, mostra que a sua candidatura não tem apelo popular. Não pode ser escutada nas ruas. É uma candidatura artificial, construída dentro de um estúdio refrigerado. A realização de um comício contrairia totalmente o cárater de uma campanha marcada pelo distanciamento do público e de um programa de governo que prevê uma administração organizada dentro de escritórios e gabinetes. Uma prefeitura concebida pelas mentes brilhantes de "alguns escolhidos", que "sabem" o que o povo precisa sem consultar o povo.

Outro ponto que não pode ser ignorado é o valor simbólico da presidenta da República possuir um posicionamento público claro sobre quem é o seu candidato preferido em Salvador. Ninguém pode empalidecer a principal fonte de observação de qualquer comentarista político: os gestos. Assim como é simbólico o apoio do ex-prefeito Antônio Imbassahy e do atual prefeito João Henrique para o candidato ACM Neto, ninguém pode atrofiar o papel desempenhado por Mário Kertész e Márcio Marinho para a vitória de Nelson Pelegrino. Não realizar um comício significa também ocultar mais um calcanhar de Aquiles ou esconder alguém. Significa ter ou não ter um palanque com representação política e popular.

Por fim, ignorar o poder de uma massa de eleitores concentrada no maior bairro popular de Salvador é no mínimo um lapso. O baixo desempenho nas urnas do último candidato petista as eleições de Salvador (2008), o atual senador Walter Pinheiro, no bairro de Cajazeiras, virou um fato para a história eleitoral da Bahia. O espólio político herdado do pai, João Durval, pelo filho, João Henrique, no bairro, é apontado como fator determinante para a vitória de João e derrota de Pinheiro.

Sem acidez, mas, pontuando apenas o que acredito ter sido um engano de Samuel Celestino, concluo minimizando o tamanho das declarações pequeninas de Dilma Rousseff sobre o candidato do Democratas, ACM Neto. Definitivamente, "Salvador não pode ter um governinho". E quem disse não fui eu. Foi a presidenta da República para milhares de pessoas no maior bairro popular de Salvador.
 
*Sócrates Santana é jornalista.

   



segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O falso profeta

Sócrates Santana

A capital baiana não precisa de um salvador da pátria. É extremamente prejudicial para a democracia a postura messiânica adotada pelo candidato do DEM. Ele não pode governar sozinho. O comportamento de ACM Neto é apocalíptico, maniqueísta e auto-destrutivo. Põe a população soteropolitana dentro de um fogo cruzado entre as esferas governamentais, anunciando um clima de disputa institucional com o governador Jaques Wagner.

Não é a possibilidade de um outro partido além do PT administrar Salvador que assusta, mas, o risco deste partido ser o DEM de ACM Neto. São poucos os municípios baianos administrados pelo Democratas na Bahia e no Brasil. Nessas eleições, o partido elegeu apenas 9 prefeitos. E o baixo desempenho eleitoral é resultado de uma política de isolamento e acirramento político permanente com os governos estadual e federal.

Outros municípios, mesmo sendo administrados por partidos de oposição ao governo estadual, conseguem desenrolar a relação entre prefeitura e estado. E o motivo é óbvio: não demarcam posições políticas, mas, simplesmente compartilham responsabilidades institucionais.

Se o governo estadual constrói um hospital dentro de uma área sem linhas de ônibus disponível, por exemplo, resta a prefeitura o papel de assegurar as condições necessárias para o equipamento funcionar plenamente, garantindo a expansão da rede pública de transporte até o local. Se isso não ocorre, quem perde é a população. O hospital é inaugurado, mas, não possui qualquer serventia, porque, um dos entes da federação não cumpriu a sua parte.   

Diferente da oposição realizada pelo PT, o DEM não tensiona com os governos petistas a partir do engajamento da sociedade civil organizada. Não possui relação sindical, nem tão pouco com os movimentos populares. Nitidamente, o DEM não é um partido de massa. Ou seja: o DEM não comporta dentro de si a vontade popular, porque, ignora organicamente a participação popular. É um partido construído dentro da burocracia institucional - fora do domínio da população. Por conta deste alheamento, o DEM de ACM Neto é uma ameaça para a democracia participativa, inclusiva e socialmente envolvida pela esfera pública.

A população não deseja um governo dos "melhores", a chamada meritocracia batizada por ACM Neto. As pessoas não querem que as decisões sejam tomadas dentro de escritórios refrigerados e gabinetes gelados. ACM Neto personifica a profissionalização da política, a divisão de tarefas e a gestão de uma cidade espartana, excludente e, portanto, autoritária.

O atual estágio caótico da capital baiana requer mais participação, envolvimento e sentimento de pertencimento. As pessoas querem e precisam participar dos problemas da cidade. Não adianta arrotar auto-suficiência, nem ludibriar a opinião pública com frases de efeito e oratória hipnótica. O próximo Carnaval de Salvador não pode ser macardo pelo bloco do eu sozinho.

*Sócrates Santana é jornalista e assessor do deputado federal Amauri Teixeira.