sexta-feira, 22 de junho de 2012

São João + 20


Amauri Teixeira*
“Se tem fogueira acesa, pode ter certeza, é noite de São João”. Já teria dito o centenário Luiz Gonzaga diante desta longa estiagem que assola o nordeste brasileiro. No país inteiro, já são 1.473 cidades em estado de emergência por causa da seca. Porque, não são os fogos de artifícios, as estrelas de tevê, nem tão pouco, os enormes palcos que tornam os festejos juninos tão famosos no Brasil. Talvez, longe da pirotecnia e das atrações midiáticas, cada cidade possa rever a maior festa popular da Bahia.
Sem necessidade de inventar a roda, o São João de 2012, pode virar um marco na história cultural dos 250 municípios baianos que já decretaram situação de emergência por conta dos efeitos da seca. É a oportunidade de notabilizar o triângulo, a zabumba e a sanfona. Incentivar a formação e promoção de grupos de forró pé-de-serra. Ou seja: produzir cultura local para pessoas que estão vindo de toda parte do país. Porque, o verdadeiro motivo de todos viajarem tantos quilômetros até o interior da Bahia está contido exatamente no que há de mais puro e original no São João: a vida do sertanejo.
Quem "desce" para Jacobina, Juazeiro, Jaguarari, Senhor do Bonfim, Nova Fátima, Cruz das Almas, Miguel Calmon, Piritiba, Uibaí, Irecê, entre outros tantos municípios, não viaja para dançar música eletrônica na boate exclusiva do camarote andante, nem para comer e beber os coquetéis e pratos mais exóticos da última estação da moda. Nada contra nenhuma dessas "mudernidades", mas, cada qual no seu cada qual. A expectativa de quem visita esses municípios é encontrar um "xodó", "o verde dos teus olhos", após "ralar coxa", arrastar o pé com o Xote das Meninas, adoçando a boca com licor de jenipapo e enchendo o buxo com macaxeira, aluá e pamonha.
Com a redução do orçamento das festas - provocado pelo mais extenso período de seca dos últimos 50 anos - o São João de 2012 impõe ao mercado da música sertaneja uma reflexão sobre o inflacionamento dos cachês, gerado pela supervalorização de atrações de fora do próprio circuito junino. A disputa para encaixar no calendário local as "grandes estrelas nacionais", estimulou ao longo dos anos uma espécie de guerra fiscal entre os municípios, sufocando os arranjos culturais e econômicos regionais em prol de uma demanda externa sem qualquer compromisso com o contexto sócio-político de cada lugar.
É claro que pela própria dimensão geográfica da festa, presente nos 417 municípios da Bahia, o São João apresenta uma vocação natural de solidariedade com os demais gêneros artísticos. Mas, o caráter predatório utilizado por agências de eventos para vender o cachê dos seus artistas as prefeituras baianas, exige do gestor público uma reação firme contra os abusos cometidos por essas empresas com - é claro - o consentimento dos artistas.
Infelizmente, raríssimas ou nenhuma iniciativa espontânea ou promocional, sinalizou qualquer gesto da classe artística do ramo da música em solidariedade ao difícil momento que vive o povo sertanejo. Pouquíssimos ou nenhum artista doou o seu cachê ou cantarolou uma única canção sem ter tido o seu dinheiro devidamente depositado pela prefeitura na sua conta.
Por essas e outras, nada mais justo que aumentar a grade de programação das nossas festas com atrações locais. Com grupos e bandas compostos por homens e mulheres da terra, que aguardam o mandacaru aflorar na seca e apontar a chuva que chega no sertão. Em meio as discussão da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, nada mais atual.
*Amauri Teixeira é deputado federal e economista.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

O partido das divididas

De grão em grão, a galinha enche o papo. Ao longo dos anos, vem sendo essa a maneira do PMDB disputar as eleições. Sem nenhum presidente eleito pelo voto popular, o maior partido do Brasil virou a legenda das beiradas. E leiam beiradas de duas formas: dos municípios e das bolas divididas. É o caso de Salvador e São Paulo.
Em Salvador, as sobras do confronto entre ACM Neto (DEM) e Nelson Pelegrino (PT) podem recair no papo do radialista Mário Kertész (PMDB). Na rinha paulista, Fernando Haddad e José Serra rivalizam com as farpas do PT e do PSDB. Com o catador nas mãos, o deputado federal Gabriel Chalita (PMDB) junta os frangalhos dos paulistanos. Ou seja: o PMDB é o partido dos dissidentes.
É bom ficar claro: o PMDB não é um partido de oposição. Sem recorrer ao enfretamento nacional, o partido do vice-presidente Michel Temer avalia a política localmente. Dança conforme a música dos costumes, sem qualquer obrigação com as decisões do Palácio do Planalto. Não faz a política do antagonismo, mas, a política da aproximação e da convergência de interesses. É o que são e o que serão as candidaturas de Mário Kertész e Gabriel Chalita.    
Ambos, por sinal, possuem em comum o caráter da dissidência. O primeiro, Mário Kertész, saiu do ninho carlista. O segundo, apesar da idade, Gabriel Chalita, troca de partido como se trocasse de camisa: PSDB, PSB e, agora, PMDB. Os dois apostam em campanhas mais provincianas, beirando o bairrismo. Sem confrontar os modelos partidários, Mário e Chalita vão desfilar como se não fossem profissionais da política.
Aparentemente, o candidato paulista tem mais elementos para realizar tal proeza. Pulou de uma legenda para outra, como quem não demonstra qualquer compromisso com os princípios partidários em si. É jovem, 43 anos, portanto, não carrega consigo o fardo de ter sido tachado de tucano, malufista, petista, nem tão pouco quercista.
O candidato soteropolitano do PMDB não é diferente. Por duas vezes, Mário Kertész administrou a cidade de Salvador. A primeira, como biônico; a segunda, como prefeito eleito pelo povo. Mas, de lá para cá, já se vão 23 anos fora de disputas eleitorais. Desses, 19 anos dedicados ao rádio. Ou seja: no imaginário da população, especialmente, entre os jovens e adultos até 40 anos, a ligação de Mário Kertész no passado com possíveis negociações envolvendo dinheiro público viraram pó.
Se por um lado, as candidaturas de Gabriel Chalita e Mário Kertész, sinalizam representar a política jogada pelo lado de fora, por outro, não possuem musculatura político-partidária, a exemplo de PT, PSDB e DEM. Os dois vão trilhar uma estrada sem final previsível, sem qualquer perspectiva clara de qual dos lados será mais prejudicado: José Serra e ACM Neto ou Fernando Haddad e Nelson Pelegrino.
Em Salvador, se por um ângulo, a candidatura de Mário dialoga com uma fatia do eleitorado mais próxima do perfil carlista, por outro, em São Paulo, Chalita é acolhido justamente por aquelas pessoas que não conheceram outra experiência de administração para além de PSDB e PT. A conta fica difícil de fechar para ambos os lados.
A promessa é de 2º turno, lá e cá. À vista um cenário propício para um embate entre três forças não partidarizadas, mas, separadas pela linha tênue das idéias que distinguem politicamente a direita, a esquerda e o centro no Brasil. Esta leitura não anula outras candidaturas, mas, sem dúvida, enquadra a fotografia mais exposta dessas eleições. Se for assim, aguardem uma das mais intrigantes disputas da história política de ambas as cidades.
*Sócrates Santana é jornalista.

terça-feira, 5 de junho de 2012

A força das velhas idéias


Sócrates Santana*  
A roupa nova do DEM caiu mal. Não convence. Continua sendo aquela velha roupa colorida por fora, mas, incolor, conservadora e autoritária por dentro. Sem força, o DEM está desbotado pela história que carrega no próprio nome: ACM Neto, Rodrigo Maia, Fábio Souto, entre outros filhotes da ditadura.
O partido aposta todas as suas fichas em Salvador. De hegemônico no estado, o DEM administra hoje apenas 11 municípios baianos. Para piorar ainda mais o quadro, o partido adotou a estratégia de concentrar os seus esforços em poucas candidaturas no país. Isso representa uma redução drástica das suas lideranças políticas, mas, principalmente, o ato consciente de jogar com as cartas que pode confiar e monitorar.
Ao DEM baiano, restou a opção de Salvador. Com o comando do partido nas mãos, o deputado federal ACM Neto condicionou o apoio a José Serra em São Paulo à reciprocidade do PSDB baiano. Sem problemas. O deputado federal Jutahy Magalhães (PSDB) aprendeu direitinho com o avô o sentido da palavra subserviência. Afinal de contas, é de autoria do ex-governador Juracy Magalhães a frase “O que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil”. Ou seja: O que é bom para São Paulo, é bom para a Bahia.
Talvez, o dilema tucano fique por conta do ex-prefeito de Salvador, Antônio Imbassahy. Sem o espectro eleitoral do deputado federal na cidade, o PSDB baiano oferece o que o DEM também pode em São Paulo: tempo de tevê. No passado, especificamente, no período FHC e ACM, a relação entre os dois partidos era encarada de maneira pontual. Isso mudou. Ao longo dos anos, ambos os lados exerceram forte influência no perfil de cada partido. Por um lado, o PSDB absorveu a pauta conservadora do DEM. Por outro, o DEM incorporou a proposta neoliberal de Estado do PSDB.
As novas idéias do DEM para Salvador são as velhas idéias do PSDB para São Paulo. A eleição de lá está conectada com a eleição daqui. E, assim como lá, entre Fernando Haddad (PT) e José Serra (PSDB), a polarização natural por aqui é entre Nelson Pelegrino (PT) e ACM Neto (DEM). Nas entrelinhas das duas disputas, quem pode sair ganhando é o PMDB de Gabriel Chalita e Mário Kertész. Mas, essa é uma outra história para um próximo comentário.
*Sócrates Santana é jornalista.