segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O hospital de 18 anos











Sócrates Santana

Quarta-feira, 26 de agosto. Saída às 7h. Uma viagem curta de 187 km até o município de Santo Antônio de Jesus, que aguarda há 18 anos a conclusão das obras do Hospital Regional do Recôncavo, visitado amanhã (27) pelo governador antes da inauguração no mês de novembro. De fala mansa e baixa estatura, Mário Luna é o colega e o piloto desta narrativa ziguezagueante pela estreita estrada até a capital do recôncavo.

De pouca conversa, apenas se o assunto for futebol ou a infância em Brotas, Luna relata neste decorrer de tempo a história policial de Batacarso, malandro polêmico do bairro de Brotas. Bom de navalha, apesar de nunca tê-lo visto trocar farpas com ninguém, Luna conta que Batacarso era témido no Engenho Velho e tinha a estranha mania de cortar as nádegas das mulheres da redondeza. Trauma de infância, supõe Luna, que segue na quinta marcha. Já é Santo Antônio de Jesus.

Na porta da cidade do comércio mais barato da Bahia uma parada obrigatória na Rádio Clube. Um conversa rápida e simpática com o radialista Ney Franco, que entre um anúncio comercial e um aperto de mão reclama da diminuição das verbas de publicidade do governo para a rádio em detrimento de emissoras menores, sem diapasão, segundo ele.

Mais adiante, o esverdeado casarão da prefeitura municipal. Escadaria acima e uma recepção acalorada de Creuza Queiroz, ex-vice prefeita de Santo Antônio de Jesus e hoje uma espécie de assessora para assuntos aleatórios. Ela conduz este jornalista até a sala da assessora de imprensa do prefeito Euvaldo de Almeida (DEM), Andréia Sued e a auxiliar Tayala Britto, que ajudou bastante ao fornecer telefone e endereço de veículos de comunicação regionais. Mas, parou por aqui. Percebi que as diferenças políticas impediram um progresso maior das conversações e partir a procura do cerimonial. Na Diretoria Regional de Educação instalada no mesmo prédio da sucursal do jornal A TARDE e da TV Recon, encontrei a avuraçada Rejane Luquine as turras diante do texto de programação da solenidade de anúncio das obras de saneamento básico no município no valor de R$ 11 milhões.

Vinte e duas horas para o evento, o palanque ainda está no chão. Em compensação o hospital está pronto. Ele fica ao lado do Batalhão da Polícia, local que o helicóptero irá sair até o próximo destino, o município de Milagres, logo após o ato em Santo Antônio de Jesus. Wagner aterrissa no estádio municipal, segue para entregar a população o novo ginásio de esportes e depois anuncia novas intervenções na cidade através do Programa Água para Todos no pátio do hospital. Numa caminhada no interior do hospital que será visitado pelo governador, um detalhe chama a atenção no percurso desenhado pela Casa Militar. O banheiro feminino é o atalho para delinear o roteiro. A solução proposta para evitar uma possível piada machista da oposição é pôr um adesivo sobre a placa que indica o “sexo” do toalete. Resolvido.

Um almoço marcado com a direção do site de notícias locais, InfoSAJ, acerto para transmitir em praça pública a entrevista do governador e telefonemas e e-mail´s para jornais e rádio locais, como a Andaiá FM. Já são quase 15h e ainda falta checar o cenário no município de Milagres, segundo destino do mesmo dia 27.


Quinta-feira, 27 de agosto. O movimento da cidade é o de rotina. Apesar das faixas e do anúncio das rádios, as escolas estão abertas. Abre parêntese. Se um assessor político quer identificar se o prefeito está ou não apoiando este ou aquele candidato, basta verificar se os estudantes estão nas ruas. É praxe, infelizmente, os prefeitos aliados deste ou daquele candidato, convocarem professores e alunos, a encherem as praças públicas. Não é o caso de Santo Antônio de Jesus. O prefeito é Euvaldo de Almeida Rosa, dos Democratas. Fecha parêntese.

Wagner pousa no estádio municipal. A comitiva seguiu até o Conjunto Habitacional Urbis II, rumo a recém construída quadra poliesportiva com cobertura de Santo Antônio de Jesus. A obra é um investimento de aproximadamente R$ 378 mil, viabilizada pela Superintendência de Desportos do Estado da Bahia (Sudesb), que investiu na Bahia em apenas dois anos e meio, cerca de R$ 12 milhões na reforma e construção de novas praças esportivas somente no interior baiano.

O governador troca passe com um garoto na quadra e corre para visitar as instalações do Hospital Regional de Santo Antônio de Jesus. Um enxame de radialistas, jornalistas, papagaios de pirata e lideranças locais quase arrombam a “entrada exclusiva” para o governador, fotógrafos e cinegrafistas acompanharem a visita ao hospital. Abre parêntese. A equipe do cerimonial, a assessoria de imprensa e a Casa Militar bem que tentaram organizar a entrada no hospital. O mar de gente, no entanto, abriu uma exceção por conta própria. Fecha parêntese.

A entrevista coletiva correu bem, apesar do assessor 01, Ernesto Marques, não concordar com a escolha do local para a realização da mesma. O local foi isolado por fitas e uni-filas pelo assessor 03, mas, os radialistas e jornalistas da região não respeitaram a área de isolamento. “Isso ocorreu também no Hospital de Juazeiro”, disse Ernesto, ponderando, contudo, que o governador esteve muito a vontade na entrevista. Ernesto acompanha a solenidade e sigo para o município de Milagres para cobrir em tempo a passagem do governador por lá. Antes, contudo, um popular respira aliviado e diz: "Finalmente, o hospital está pronto". Mais adiante, assim que coloquei os pés no carro, um radialista puxa meu braço e brinca: "Hospital completa maior idade e Wagner tem voto garantido", promete a manchete.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Os engraxates I


Sócrates Santana

Quinta-feira, 13 de agosto de 2009. Saída às 9h. O interfone toca e o porteiro avisa: "O carro já chegou". Peço para aguardar cinco minutos. Escada abaixo. De camisa alaranjada, lentes de coronel e rugas amarradas, o motorista Abdul Legalle aguarda sem descolar o calçado de dedos para fora do pedal. Pronto, de sacola atrás do banco, Legalle seguiu vagarosamente até a BA 93, sentido agreste de Alagoinhas, município de Olindina. Lá, o governador Jaques Wagner inaugura obras do Programa Água para Todos e celebra 51 anos de emancipação política com a população, que realiza a micareta local. Na tentativa de ganhar a confiança de Legalle, puxo conversa e pergunto: "Gosta de carnaval". Ele é taxativo: "Não, prefiro ficar em casa". Pouco a pouco, Legalle desiste das monossílabas e antes de percorrer os 202 km entre a capital e Olindina, consigo tirar do colega de viajem a "origem mestiça", como o próprio diz, da família. O pai, filho de francês. A mãe, árabe. Da relação, numa espécie de êxodo via oceano atlântico, nasceu no convés do navio, Abdul Legalle.

Após duas horas e minutos adiante, Olindina. A primeira porta é a prefeitura. O porteiro é o presidente do PT municipal, o João sem confusão. Faz comentários sobre a região e indica o caminho até a sala do prefeito, João Ribeiro (PSB), que está reunido com o cerimonial do governador, representado pelo marombeiro das cinco da matina, Cléber. Na ocasião, o prefeito transfere para a assessoria uma série de demandas locais, como a construção de uma praça pública para a juventude no valor de R$ 800 mil, projeto que já conta com o apreço do secretário de Desenvolvimento Urbano, Afonso Florense.
O contato com a imprensa é realizado por telefone e a tarefa é compartilhada com o sonâmbulo Edmundo Filho. Abre parêntese. Uma verdadeira antena parabólica, uma onda quântica que trânsita pelo sistema de radiodifusão da Bahia. Diz a lenda que Edmundo Filho não dorme há 2 anos. Fecha parêntese.
Ainda resta no roteiro o reconhecimento da área: estádio para o pouso do helicóptero, dando prosseguimento ao palanque. Por sinal, um outdoor de cervejaria, prontamente encoberto por uma lona preta. No carro, ligo o som na rádio Luandê FM, que anuncia: "Amanhã, a cobertura da visita do governador Jaques Wagner em Olindina, aqui, na Luande FM", penso comigo: "Deu certo ligar para a rádio" e continuo sintonizado na emissora sergipana. "A verdade é que Wagner tá indo na Bahia inteira e levando água boa para muita gente que corria atrás de carro pipa", comenta o radialista. Enquanto isso, um garoto tira o meu sapato repentinamente e começa a engraxar. Sai por R$ 1. Danilo é o nome dele, o engraxate. A tarde finda e o sol desaparece. É noite.

Os engraxates II

Foto: Manu Dias













Sócrates Santana


Sexta-feira, 14 de agosto. A população de Olindina acorda cedo para acompanhar a marcha cívica de 51 anos de emancipação política da cidade. O tilintar da banda da escola militar é acompanhado por jovens devidamente fardados, apesar da ensolarada manhã na avenida Otávio Mangabeira, ao lado do deteriorado mercado municipal.
As horas são curtas e o governador aterrissa no município ao lado da deputada federal Lidice da Mata , o secretário de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Nelson Pelegrino e o deputado estadual Ubaldino. De sorriso largo, Wagner não perde tempo. Entra no carro e segue até as intermediações do palanque. Avista uma mercearia e resolve bater um papo com o dono sobre as quinquilharias do comerciante. Tira foto e na saída é surpreendido por um pequeno engraxate. "Governador, vai fazer o sapato". Wagner pergunta: "Porque você tá todo cheio de graxa deste jeito" e explica que não pode fazer o sapato.
Apesar do clima de micareta, a população reivindica a instalação do comando da polícia militar na região. Wagner não vacila e garante o retorno do comando. Continua e revela para os olindinenses o sentido desta visita. "Venho anunciar uma revolução silenciosa. Uma obra aparentemente pequena, que os políticos não gostam de fazer, porque ninguém ver, mas, que muda o jeito das pessoas viverem e que as pessoas não esquecem, porque precisam dela todos os dias, a água".
E quem pôde visitar uma dessas famílias que entendem o significado das palavras do governador vai compreender a dimensão desta iniciativa. Ao invés de pôr no canto da cozinha baldes cheio d água para as eventualidades diárias, como lavar um copo, tomar banho ou enxaguar a roupa, agora basta girar a torneira para ter água sem sair de casa nem correr atrás de carro pipa. Ao menos será assim para os moradores das comunidades de bebedouro, Bom Viver, Cascalheira, Cento e Dois, Colônia Nova, Funil, Lagoa Sexa, Mia Gato e Nova Minação.
As pressas, uma vaga de volta no avião, saindo de Cipó, ao lado do jornalista e assessor 01 do governador, Ernesto Marques, o capa preta e cidadão de Itambé, Nelson Simões, e o presidente da Companhia de Engenharia Ambiental da Bahia, Cícero Monteiro. Um retorno embriagado de recordações da infância, deles.



terça-feira, 11 de agosto de 2009

Os homens de chapéu

Foto: Manu Dias











Sábado, 1º de agosto de 2009. Saída às 6h30. O destino, o município de Rafael Jambeiro (a 217 km de Salvador). O roda presa da vez é o motorista Aldemir, aos comparsas "Mimi". De ar condicionado baixo (nível 1), engata a segunda e segue pela estrada do côco para buzinar na corinthiana residência do jornalista e assessor 02 do governador, Isaac Jorge.
Abre parêntese. O "zero dois" é uma invenção de um carioca abaianado, Eduardo Eurico. Aliás, prática questionável de rotular as pessoas com piadas de redação, malmente o foca da vez "se achega" e já ganha a toga de 03. Fecha parêntese.

Uma cidade misérrima, como a maior parte da Bahia. O governador Jaques Wagner pousa no terreno batido e é recepcionado pela prefeita petista Cibele Carvalho, que puxou o galego pelo braço até a recém inaugurada Unidade de Saúde da Família Firmino Carmo, nome de uma família tradicional da região.

O narrador improvisa: "Quem tem pé vai a pé", logo após a inauguração da USF. Um mundareú de gente repentinamente circunda a comitiva até o Centro Digital de Cidadania, que também será entregue pelo governador. Placa desvelada e um percurso de barro antecede uma calçada de paralelepípedo rumo ao centro da cidade.

Ao longe, um palanque rodeado pela população. Uma filarmônica harmoniza o cenário de visita ao interior, que no chapéu sertanejo revela o andar ou desandar entre um discurso e outro. A mão no queixo, o semblante compenetrado, a destreza de cada piscar. A prefeita fala e é aplaudida. A caneta anota os nomes dos secretários das barbichas e óculos, Rui Costa e Afonso Florense, assim como os deputados, Paulo Rangel e Bira Coroa.

O governador elogia e visualiza a vida das pessoas que vão enxergar a noite sem o candeeiro e beber água sem caminhar com a cuia na cabeça. É o Luz e o Água para Todos. Por um lado, tem gente que vai acender pela primeira uma lâmpada, por outro, vai tomar um copo d´água pingando da torneira de casa.